domingo, 9 de março de 2008

V Domingo da Quaresma - Iº DOMINGO DA PAIXÃO





O mistério pascal, diz São Leão, tem de direito e de fato o primeiro lugar entre as solenidades cristãs. E se é certo que o nosso viver de todos os anos nos devia ir sempre dispondo gradualmente para o celebrarmos de maneira digna e adequada, os dias que vamos atravessar deve incitar-nos a uma devoção mais fervorosa, porque, tenhamo-lo presente que aproxima-se a maior solenidade do mais divino mistério da misericórdia. Este mistério é o da Paixão e Ressurreição do Senhor; Pontífice e Mediador do Novo Testamento, Jesus vai subir em breve ao patíbulo da Cruz e apresentar ao Pai, ao penetrar no Santo dos santos dos Céus, o preço do nosso resgate na moeda batida e cunhada com o sangue do seu sacrifício.



"Eis, canta a Igreja, que resplandece o Mistério da Cruz em que a vida morreu, mas de tal sorte que morrendo nos deu a vida". A Eucaristia é o memorial deste imenso amor de Deus aos homens, porque o Senhor ao instruí-los disse: "Isto é meu corpo que será entregue por vós. Este é o cálice da nova aliança no meu sangue. Fazei isto em minha memória". E para corresponder a toda esta bondade divina, que fez o homem? "Os seus não o receberam, diz São João, e pagamos com o mal o bem que nos fez", retribuímo-lo com ultrajes, "desonramo-lo", como ele mesmo se queixou.



O Evangelho mostra com efeito o ódio crescente do Sinédrio. Abraão pai do povo de Deus, acreditara firmemente nas promessas divinas que anunciavam o Salvador e no Limbo sua alma se alegrou ao ver realizadas com a vinda do messias. Mas os judeus, que deviam reconhecer em Jesus Cristo o filho de Deus, maior que Abraão e os profetas, não quiseram entender o sentido das palavras, e depois de o maltratar por todos os meios que a malícia pode inventar, tentaram apedrejá-lo. No entanto Jesus domina-os com todo o poder de sua personalidade divina, porque, como diz Jeremias foi estabelecido como uma cidade fortificada, cingida com muralhas de ferro e de bronze na face do Reis dos reis da Judéia, dos príncipes dos sacerdotes e do povo. "Hão-de-te combater, mas não vencerão pois estou contigo para te salvar". Quanto a mim, dissera o Salvador, não busco a própria glória mas há quem busque e julgue. E pela boca do Salmista continua nestes dolorosos acentos: "Julgai me Senhor, e discerni a minha causa com a deste povo ímpio. Livrai me do homem perverso e enganador. Livrai-me dos meus inimigos, arrancai-me das mãos dos homens violentos e da vontade pervertida". Deus com efeito não permite que os homens façam mal ao Senhor antes de sua hora. E quando a hora da imolação chegar, virá a da glorificação também, a da ressurreição.



Esta morte e ressurreição predisseram os profetas e simbolizou-a Isaías. Foi pela vontade de Deus que Jesus passasse pela humilhação, pelo sofrimento e pela morte, antes de entrar na glória. Os judeus porém, cegos pela paixão, esperavam um messias glorioso e, escandalizados com a Cruz de Jesus, rejeitaram a salvação. Foi por isso que Deus os rejeitou e acolheu com benevolência aqueles que esperavam na Cruz do Salvador; porque, diz São Leão, a esperança da vida eterna é coisa certa e segura para todos os que participam da Paixão do Senhor. E agora que vamos comemorar a Paixão do Senhor, pensemos que para participarmos dos seus benefícios é necessário lutar e sofrer. Só os lutadores e sofredores serão coroados, e os que rejeitam a dor e o sofrimento, buscando conforto e vida mansa, receberão tormentos na vida futura.



A Igreja manda neste domingo cobrir com véus escuros as imagens dos santos, porque não seria legítimo distrair-mos com os santos de nossa devoção, diante do grande mistério que se opera, Se conserva também coberto por véus os crucifixos, por se tratar de um antigo costume medieval, no qual as cruzes mais refletiam a glória do que a Paixão. Tudo demonstra um sofrimento de dor da Igreja diante do Esposo que foi morto pelos nossos pecados.


Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João: Naquele tempo: Disse Jesus:
Quem de vós me acusará de pecado? Se vos falo a verdade, por que me não credes?
Quem é de Deus ouve as palavras de Deus, e se vós não as ouvis é porque não sois de Deus.
Responderam então os judeus: Não dizemos com razão que és samaritano, e que estás possesso de um demônio?
Respondeu-lhes Jesus: Eu não estou possesso de demônio, mas honro a meu Pai. Vós, porém, me ultrajais!
Não busco a minha glória. Há quem a busque e ele fará justiça.
Em verdade, em verdade vos digo: se alguém guardar a minha palavra, não verá jamais a morte. Disseram-lhe os judeus: Agora vemos que és possuído de um demônio. Abraão morreu, e também os profetas. E tu dizes que, se alguém guardar a tua palavra, jamais provará a morte...
És acaso maior do que nosso pai Abraão? E, entretanto, ele morreu... e os profetas também. Quem pretendes ser?
Respondeu Jesus: Se me glorifico a mim mesmo, a minha glória não é nada; meu Pai é quem me glorifica, aquele que vós dizeis ser o vosso Deus
e, contudo, não o conheceis. Eu, porém, o conheço e, se dissesse que não o conheço, seria mentiroso como vós. Mas conheço-o e guardo a sua palavra.
Abraão, vosso pai, exultou com o pensamento de ver o meu dia. Viu-o e ficou cheio de alegria.
Os judeus lhe disseram: Não tens ainda cinqüenta anos e viste Abraão!...
Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo: antes que Abraão fosse, eu sou.
A essas palavras, pegaram então em pedras para lhas atirar. Jesus, porém, se ocultou e saiu do templo.



Lefebvre, Dom Gaspar. Missal Quotidiano e Vesperal. Bruges, Bélgica; Abadia de S. André, 1960.

Um comentário:

Ecclesiae Dei disse...

Quanta riqueza em seus comentários. Como o mundo pode ficar cego a tudo o que Jesus passou por nós, a esse amor tão grande? É triste... mas continuo amando a Jesus, também por aqueles que não O amam, mesmo com todas as minhas limitações.