domingo, 16 de março de 2008

SOLENIDADE DO DOMINGO DE RAMOS - INÍCIO DA GRANDE SEMANA SANTA (SEGUNDO DOMINGO DA PAIXÃO)











A liturgia de hoje exprime por meio de suas cerimônias, uma impregnada alegria, outra de tristeza, o duplo aspecto sob que podemos considerar a Cruz. Em primeiro lugar, a benção e a procissão de Ramos. Aqui tudo respira a alegria radiosa e deslumbrada que nos permite reviver há quase vinte séculos de distância a cena grandiosa da entrada triunfal do Salvador em Jerusalém. Depois vem a missa, cujo os cânticos e leituras se reportam ao doloroso acontecimento da Paixão.



Em Jerusalém, no século IV, lia-se neste Domingo, e lugar do acontecimento a perícopa do Evangelho que refere a entrada apoteótica do Salvador na cidade santa, aclamado pelas turbas como Rei de Israel. Depois o bispo montado num Jumento, ia no monte das Oliveiras na Igreja da Ressurreição, acompanhado do povo, com palmas nas mãos, ao canto de hinos e antífonas. A Igreja de Roma adotou este costume somente no século IX e ajuntou-lhe a benção dos Ramos. Na procissão dos Ramos, o povo cristão, na plenitude da sua fé, repete os gestos dos judeus, dando-lhe todo o seu significado. Como o povo de Jerusalém aclama a Cristo como triunfador: "Hosana ao filho de David! Bendito o que vem em nome do Senhor!" Mas, conhecedores pela fé, da seqüencia e do significado dos acontecimentos, sabemos o que é e o que representa esse triunfo. Jesus é o Messias, Filho de David e o Filho de Deus. Sinal de contradição, é aclamado por uns, detestado por outros. Enviado ao mundo para nos libertar das garras do pecado e do poder de Satanás, sujeita-se a paixão, castigo dos nossos pecados, mas sai triunfante do sepulcro, vencedor da morte; restitui-nos a paz de Deus e introduz-nos consigo no reino do Pai celeste.



Depois da benção dos ramos, que se efetuava em Santa Maria Maior, a procissão se dirigia a Igreja estacional de São João do Latrão. Era nesta basílica que se celebrava a missa, dominada pelo pensamento da Paixão do Salvador. O triunfo do Salvador deve ser precedido da "sua humilhação até a morte e morte de Cruz". Isto encerra um ensinamento que deve orientar a nossa conduta: temos de nos humilhar, imitando a Jesus Cristo na sua paixão, se queremos participar da sua ressurreição.



Explicação da Paixão:



Getsémani



Depois de celebrada a ceia com seus discípulos, Jesus saiu com eles da cidade pela porta do lado da piscina de Siloé, subiu a vale do Cedrão, ao longo do bairro de Ofel, e encaminhou-se para o Getsémani, no sopé do monte das Oliveiras. Os três Apóstolos que foram testemunhas de sua Transfiguração assistem agora a sua agonia, por três vezes renovada. Judas que vendera o Mestre, sai da cidade à frente da corte e dos gardas do templo enviados pelo Sinédrio para prender Jesus. Prendem o Senhor e voltam a Jerusalém pela vereda do Nordeste, dirigindo-se para a casa do Sumo-Sacerdote.



Diante de Anás e Caifá



O Sinédrio compunha-se de setenta membros presididos pelos príncipes dos sacerdotes e superiormente pelo Sumo-Sacerdote, que era naquele ano Caifás, genro de Anás, o qual obtivera sucessivamente para os filhos e para o genro o Supremo Pontificado. Infiéis a sua missão, os representantes oficiais da religião de Israel esperavam um messias guerreiro que os livrassem do julgo dos Romanos. Jesus foi primeiro conduzido a presença de Anás, que não sendo sacerdote era incompetente para julgar o Senhor. O processo começava irregular logo de princípio. Noutra parte deste mesmo edifício esperava Caifás, de pernas cruzadas, segundo o uso, num estado um pouco elevado, tendo em torno de si toda a classe sacerdotal sentada em coxins dispostos para o efeito. O Senhor foi conduzido a sua presença e o julgamento prosseguiu ilegalmente, pois deveria ser feito durante o dia e eram cerca de duas horas da madrugada. O depoimento feito pelas supostas testemunhas era insuficiente e contraditório. Então Caifás, encolerizado, esconjura insolentemente o Senhor (infringindo a lei mosaica que neste caso anula a confissão do acusado) a que lhe diga se é realmente o filho de Deus. E Jesus, que esperava aquele momento para falar, declara oficialmente a sua divindade, na presença da autoridade religiosa reunida no conselho. O Sumo-Sacerdote rasga então as veste e o Sinédrio o declara réu de blasfêmia e merecedor de morte. O Senhor aceita a sentença, pois é precisamente como filho de Deus que há de oferecer ao Pai, pelos homens, um sacrifício de valor infinito.



Negação de Pedro. Desespero de Judas



Entregaram-no então, durante o resto da noite, à zombaria dos criados, que o cobriram de injúrias, cuspindo-lhe no rosto. Pedro, que João introduzira no pátio do palácio do Sumo Sacerdote, negou por três vezes o mestre. Depois de o galo cantar a segunda vez, saiu para fora e chorou amargamente. "Chorou alto", como diz o texto grego. De manhã, o Sinédrio tornou a reunir-se para dar a sentença, proferida ilegalmente durante a noite, para dar aparência de legalidade. O Senhor compareceu e foi novamente condenado. Judas então compreendeu o tamanho de seu crime. Roído de remorso, vai ter com o Sinédrio ainda reunido e confessa que pecou ao entregar um sangue justo. Desesperado e perseguido pelos fantasmas da sua própria desgraça, arremessa ao chão, dentro do templo, o dinheiro que recebera, vai a piscina de Siloé, mete-se pela garganta do Hinom até um lugar chamado Geena e enforca-se, partindo o laço e desfazendo-se nas pontas dos rochedos.



Diante de Pilatos



Só a autoridade romana, de que dependia então a Palestina, tinha direitos de vida e de morte. Era, pois, necessário remeter o processo ao procurador romano. Conduziram, portanto, o Senhor ao pretório de Pilatos, que ficava na torre Antônia. Os judeus não entraram por que tinham por pecado entrar na casa de um pagão às vésperas da Páscoa. Ia se instaurar-se o processo civil, mas era necessário um crime de caráter político. Os judeus saberão inventá-lo. O Messias para os judeus, devia ser, como já vimos, um monarca terrestre, um rei glorioso e conquistador. Ora Jesus dize-se messias. Nada mais fácil, portanto, que citá-lo perante Pilatos como amotinador do povo, concorrente de César no direito ao mandato supremo. No decorrer deste processo, Jesus manteve a mesma atitude da noite anterior; o mesmo silêncio perante as acusações, a mesma afirmação peremptória da sua realeza e finalmente o mesmo tratamento desumano por parte dos soldados de César. Jesus que tudo via e conduzia e só queria ser condenado como filho de Deus e Rei das almas, colocou a questão nitidamente no terreno religioso: "o meu reino não é deste mundo". Pilatos reconheceu que Jesus estava inteiramente inocente. Mas os judeus não se deixaram vencer e recorreram as ameaças. Pilatos, demasiado fraco para usar da autoridade diante do povo amotinado, que, sem dúvida, se vingaria dele acusando-o a César, procurou a força de expedientes contentar o povo e não ofender os protestos duns restos de consciência pagã e supersticiosa, que o receio vago dum possível castigo dos deuses tinha despertados.



Jesus enviado a Herodes. Barrabás



Sabendo Pilatos que Jesus era Galileu, enviou-o a Herodes, tetrarca da Galiléia, filho daquele Herodes que ordenou o massacre dos inocentes, quando os magos lhe anunciaram o nascimento do "Rei dos Judeus". Humilhado com o silêncio do Senhor, quis humilhar também os Judeus, vestindo Jesus com um manto branco dos candidatos à realeza, e remetendo-o novamente a Pilatos.



Não surtiu o melhor efeito a escolha entre o homicida Barrabás e Jesus.



A Flagelação



Era um suplício infamante, reservado aos escravos. O paciente despojado dos vestidos e atado pelas mãos à argola dum cepo, recebia os golpes que o executor lhe ia aplicando compassadamente no dorso curvo. Com os látegos do corpo, rasgava-lhe as espáduas e o peito em sulcos profundos donde jorrava o sangue e se descolavam pedaços de carne. Neste estado tristíssimo, mandou Pilatos cobri-lo com um manto escarlate, colocá-lo a coroa e o cetro e apresentá-lo a multidão. Os judeus compreenderam toda a ironia deste gesto. Ousariam ver ainda neste homem um competidor de César?



Condenação de Jesus



Os judeus continuam a insistir, com despeito, no título de filho de Deus, que será a causa única por que o hão de condenar a morte. Pilatos, que não resiste ao argumento decisivo com que os judeus o atacam, duma denúncia a César, recorre ao último expediente e lava as mãos perante o povo, querendo com isso significar que Jesus é inocente e não o condena senão porque assim o judeus o exigem em virtude de suas leis. Foi o que afirmou até o fim, mandando fixar na Cruz a inscrição declaratória do crime e do motivo da condenação: "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus", Pilatos porque era fraco e covarde, é, sem dúvida, culpado; mas os judeus, levando só por ódio o Pretor a condená-lo a morte, cometeram um deicídio.



A Caminho do Calvário. Crucifixão



Cerca das onze horas, O Senhor deixou o Pretório e encaminhou-se para o Calvário, pelo caminho que desce para o Vale Tirofeon, e volta depois para leste pela escarpa que dá para as portas da cidade. Era ali, fora dos muros, o Gólgota ou lugar da execuções. Cerca do meio-dia, o Sol escureceu-se, fenômeno constatado em toda a extensão do Império, é no meio desta noite tenebrosa que o Senhor dá seu último suspiro. A cruz era o mais cruel e atroz dos suplícios: porque a vítima, completamente imobilizada, devia suportar durante várias horas todo peso do corpo nos braços estendidos. A tensão terrível questiona o sangue, fazendo afluir a face e o peito e provocando uma sede ardentíssima. Morrer crucificado é morrer de pura dor, na mais atroz das agonias. Quando a noite suspendia o supliciado ainda vivo, para lhe apressar a morte, quebravam-lhe as pernas, que, de ordinário, estavam a um metro do solo.



Morte e Sepultura



Está para chegar o momento decisivo que marcará para o gênero humano a hora do resgate. Para mostrar que não é constrangido, mas é por amor do Pai e dos homens que aceita a morte, Jesus dá um grande grito e suspira. Morrer o Salvador. Com Maria, sua Mãe, e São João, fiquemos de pé junto da Cruz; e com os judeus, que então se converteram, batamos no peito, porque foi para expiar nossos pecados que ele morreu.



Eram três horas da tarde. Às cinco, o Senhor foi retirado da Cruz e colocado às pressas no sepulcro, porque as seis começava o Sábado, que naquele ano era muito solene. Coincidia com o 14 de Nisan, o dia mais importante das festas da Páscoa e que representava à maravilha o repouso eterno em que o Senhor entrava. Os judeus não tinham cemitérios. Sepultavam os seus geralmente em sepulcros privativos de famílias, cavados numa propriedade, ou então à beira das grandes vias de comunicação. Jesus foi deposto no sepulcro que José de Arimatéia possuía numa propriedade junto do Calvário.



Repitamos amorosamente, com o Senhor, a oração da comunhão: "Pai se este cálice não pode passar sem que eu beba, faça-se a vossa vontade!"



"Pueri Hebraeorum portantes ramos olivarum, obviaverunt Domino, clamantes et dicentes: Hosanna in excelsis"



Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus: Naquele tempo:
Aproximavam-se de Jerusalém. Quando chegaram a Betfagé, perto do monte das Oliveiras, Jesus enviou dois de seus discípulos,
dizendo-lhes: Ide à aldeia que está defronte. Encontrareis logo uma jumenta amarrada e com ela seu jumentinho. Desamarrai-os e trazei-mos.
Se alguém vos disser qualquer coisa, respondei-lhe que o Senhor necessita deles e que ele sem demora os devolverá.
Assim, neste acontecimento, cumpria-se o oráculo do profeta:
Dizei à filha de Sião: Eis que teu rei vem a ti, cheio de doçura, montado numa jumenta, num jumentinho, filho da que leva o jugo (Zc 9,9).
Os discípulos foram e executaram a ordem de Jesus.
Trouxeram a jumenta e o jumentinho, cobriram-nos com seus mantos e fizeram-no montar.
Então a multidão estendia os mantos pelo caminho, cortava ramos de árvores e espalhava-os pela estrada.
E toda aquela multidão, que o precedia e que o seguia, clamava: Hosana ao filho de Davi! Bendito seja aquele que vem em nome do Senhor! Hosana no mais alto dos céus!



Gloria laus et honor tibi sit, Rex Christe, Redemptor: Cui puerile decus prompsit Hosanna pium.






Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus:
Naquele tempo:
Retirou-se Jesus com eles para um lugar chamado Getsêmani e disse-lhes: Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar. E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes, então: Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo. Adiantou-se um pouco e, prostrando-se com a face por terra, assim rezou: Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice! Todavia não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres. Foi ter então com os discípulos e os encontrou dormindo. E disse a Pedro: Então não pudestes vigiar uma hora comigo... Vigiai e orai para que não entreis em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca. Afastou-se pela segunda vez e orou, dizendo: Meu Pai, se não é possível que este cálice passe sem que eu o beba, faça-se a tua vontade! Voltou ainda e os encontrou novamente dormindo, porque seus olhos estavam pesados. Deixou-os e foi orar pela terceira vez, dizendo as mesmas palavras. Voltou então para os seus discípulos e disse-lhes: Dormi agora e repousai! Chegou a hora: o Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos pecadores... Levantai-vos, vamos! Aquele que me trai está perto daqui. Jesus ainda falava, quando veio Judas, um dos Doze, e com ele uma multidão de gente armada de espadas e cacetes, enviada pelos príncipes dos sacerdotes e pelos anciãos do povo. O traidor combinara com eles este sinal: Aquele que eu beijar, é ele. Prendei-o! Aproximou-se imediatamente de Jesus e disse: Salve, Mestre. E beijou-o. Disse-lhe Jesus: É, então, para isso que vens aqui? Em seguida, adiantaram-se eles e lançaram mão em Jesus para prendê-lo. Mas um dos companheiros de Jesus desembainhou a espada e feriu um servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha. Jesus, no entanto, lhe disse: Embainha tua espada, porque todos aqueles que usarem da espada, pela espada morrerão. Crês tu que não posso invocar meu Pai e ele não me enviaria imediatamente mais de doze legiões de anjos? Mas como se cumpririam então as Escrituras, segundo as quais é preciso que seja assim? Depois, voltando-se para a turba, falou: Saístes armados de espadas e porretes para prender-me, como se eu fosse um malfeitor. Entretanto, todos os dias estava eu sentado entre vós ensinando no templo e não me prendestes. Mas tudo isto aconteceu porque era necessário que se cumprissem os oráculos dos profetas. Então os discípulos o abandonaram e fugiram. Os que haviam prendido Jesus levaram-no à casa do sumo sacerdote Caifás, onde estavam reunidos os escribas e os anciãos do povo. Pedro seguia-o de longe, até o pátio do sumo sacerdote. Entrou e sentou-se junto aos criados para ver como terminaria aquilo. Enquanto isso, os príncipes dos sacerdotes e todo o conselho procuravam um falso testemunho contra Jesus, a fim de o levarem à morte. Mas não o conseguiram, embora se apresentassem muitas falsas testemunhas. Por fim, apresentaram-se duas testemunhas, que disseram: Este homem disse: Posso destruir o templo de Deus e reedificá-lo em três dias. Levantou-se o sumo sacerdote e lhe perguntou: Nada tens a responder ao que essa gente depõe contra ti? Jesus, no entanto, permanecia calado. Disse-lhe o sumo sacerdote: Por Deus vivo, conjuro-te que nos digas se és o Cristo, o Filho de Deus? Jesus respondeu: Sim. Além disso, eu vos declaro que vereis doravante o Filho do Homem sentar-se à direita do Todo-poderoso, e voltar sobre as nuvens do céu. A estas palavras, o sumo sacerdote rasgou suas vestes, exclamando: Que necessidade temos ainda de testemunhas? Acabastes de ouvir a blasfêmia! Qual o vosso parecer? Eles responderam: Merece a morte! Cuspiram-lhe então na face, bateram-lhe com os punhos e deram-lhe tapas, dizendo: Adivinha, ó Cristo: quem te bateu? Enquanto isso, Pedro estava sentado no pátio. Aproximou-se dele uma das servas, dizendo: Também tu estavas com Jesus, o Galileu. Mas ele negou publicamente, nestes termos: Não sei o que dizes. Dirigia-se ele para a porta, a fim de sair, quando outra criada o viu e disse aos que lá estavam: Este homem também estava com Jesus de Nazaré. Pedro, pela segunda vez, negou com juramento: Eu nem conheço tal homem. Pouco depois, os que ali estavam aproximaram-se de Pedro e disseram: Sim, tu és daqueles; teu modo de falar te dá a conhecer. Pedro então começou a fazer imprecações, jurando que nem sequer conhecia tal homem. E, neste momento, cantou o galo. Pedro recordou-se do que Jesus lhe dissera: Antes que o galo cante, negar-me-ás três vezes. E saindo, chorou amargamente. Chegando a manhã, todos os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo reuniram-se em conselho para entregar Jesus à morte. Ligaram-no e o levaram ao governador Pilatos. Judas, o traidor, vendo-o então condenado, tomado de remorsos, foi devolver aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos as trinta moedas de prata, dizendo-lhes: Pequei, entregando o sangue de um justo. Responderam-lhe: Que nos importa? Isto é lá contigo! Ele jogou então no templo as moedas de prata, saiu e foi enforcar-se. Os príncipes dos sacerdotes tomaram o dinheiro e disseram: Não é permitido lançá-lo no tesouro sagrado, porque se trata de preço de sangue. Depois de haverem deliberado, compraram com aquela soma o campo do Oleiro, para que ali se fizesse um cemitério de estrangeiros. Esta é a razão por que aquele terreno é chamado, ainda hoje, Campo de Sangue. Assim se cumpriu a profecia do profeta Jeremias: Eles receberam trinta moedas de prata, preço daquele cujo valor foi estimado pelos filhos de Israel; e deram-no pelo campo do Oleiro, como o Senhor me havia prescrito. Jesus compareceu diante do governador, que o interrogou: És o rei dos judeus? Sim, respondeu-lhe Jesus. Ele, porém, nada respondia às acusações dos príncipes dos sacerdotes e dos anciãos. Perguntou-lhe Pilatos: Não ouves todos os testemunhos que levantam contra ti? Mas, para grande admiração do governador, não quis responder a nenhuma acusação. Era costume que o governador soltasse um preso a pedido do povo em cada festa de Páscoa. Ora, havia naquela ocasião um prisioneiro famoso, chamado Barrabás. Pilatos dirigiu-se ao povo reunido: Qual quereis que eu vos solte: Barrabás ou Jesus, que se chama Cristo? (Ele sabia que tinham entregue Jesus por inveja.) Enquanto estava sentado no tribunal, sua mulher lhe mandou dizer: Nada faças a esse justo. Fui hoje atormentada por um sonho que lhe diz respeito. Mas os príncipes dos sacerdotes e os anciãos persuadiram o povo que pedisse a libertação de Barrabás e fizesse morrer Jesus. O governador tomou então a palavra: Qual dos dois quereis que eu vos solte? Responderam: Barrabás! Pilatos perguntou: Que farei então de Jesus, que é chamado o Cristo? Todos responderam: Seja crucificado! O governador tornou a perguntar: Mas que mal fez ele? E gritavam ainda mais forte: Seja crucificado! Pilatos viu que nada adiantava, mas que, ao contrário, o tumulto crescia. Fez com que lhe trouxessem água, lavou as mãos diante do povo e disse: Sou inocente do sangue deste homem. Isto é lá convosco! E todo o povo respondeu: Caia sobre nós o seu sangue e sobre nossos filhos! Libertou então Barrabás, mandou açoitar Jesus e lho entregou para ser crucificado. Os soldados do governador conduziram Jesus para o pretório e rodearam-no com todo o pelotão. Arrancaram-lhe as vestes e colocaram-lhe um manto escarlate. Depois, trançaram uma coroa de espinhos, meteram-lha na cabeça e puseram-lhe na mão uma vara. Dobrando os joelhos diante dele, diziam com escárnio: Salve, rei dos judeus! Cuspiam-lhe no rosto e, tomando da vara, davam-lhe golpes na cabeça. Depois de escarnecerem dele, tiraram-lhe o manto e entregaram-lhe as vestes. Em seguida, levaram-no para o crucificar. Saindo, encontraram um homem de Cirene, chamado Simão, a quem obrigaram a levar a cruz de Jesus. Chegaram ao lugar chamado Gólgota, isto é, lugar do crânio. Deram-lhe de beber vinho misturado com fel. Ele provou, mas se recusou a beber. Depois de o haverem crucificado, dividiram suas vestes entre si, tirando a sorte. Cumpriu-se assim a profecia do profeta: Repartiram entre si minhas vestes e sobre meu manto lançaram a sorte (Sl 21,19). Sentaram-se e montaram guarda. Por cima de sua cabeça penduraram um escrito trazendo o motivo de sua crucificação: Este é Jesus, o rei dos judeus. Ao mesmo tempo foram crucificados com ele dois ladrões, um à sua direita e outro à sua esquerda. Os que passavam o injuriavam, sacudiam a cabeça e diziam: Tu, que destróis o templo e o reconstróis em três dias, salva-te a ti mesmo! Se és o Filho de Deus, desce da cruz! Os príncipes dos sacerdotes, os escribas e os anciãos também zombavam dele: Ele salvou a outros e não pode salvar-se a si mesmo! Se é rei de Israel, desça agora da cruz e nós creremos nele! Confiou em Deus, Deus o livre agora, se o ama, porque ele disse: Eu sou o Filho de Deus! E os ladrões, crucificados com ele, também o ultrajavam. Desde a hora sexta até a nona, cobriu-se toda a terra de trevas. Próximo da hora nona, Jesus exclamou em voz forte: Eli, Eli, lammá sabactáni? - o que quer dizer: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? A estas palavras, alguns dos que lá estavam diziam: Ele chama por Elias. Imediatamente um deles tomou uma esponja, embebeu-a em vinagre e apresentou-lha na ponta de uma vara para que bebesse. Os outros diziam: Deixa! Vejamos se Elias virá socorrê-lo. Jesus de novo lançou um grande brado, e entregou a alma. E eis que o véu do templo se rasgou em duas partes de alto a baixo, a terra tremeu, fenderam-se as rochas. Os sepulcros se abriram e os corpos de muitos justos ressuscitaram. Saindo de suas sepulturas, entraram na Cidade Santa depois da ressurreição de Jesus e apareceram a muitas pessoas. O centurião e seus homens que montavam guarda a Jesus, diante do estremecimento da terra e de tudo o que se passava, disseram entre si, possuídos de grande temor: Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus! Havia ali também algumas mulheres que de longe olhavam; tinham seguido Jesus desde a Galiléia para o servir. Entre elas se achavam Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago e de José, e a mãe dos filhos de Zebedeu. À tardinha, um homem rico de Arimatéia, chamado José, que era também discípulo de Jesus, foi procurar Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Pilatos cedeu-o. José tomou o corpo, envolveu-o num lençol branco e o depositou num sepulcro novo, que tinha mandado talhar para si na rocha. Depois rolou uma grande pedra à entrada do sepulcro e foi-se embora.
Lefebvre, Dom Gaspar. Missal Quotidiano e Vesperal. Bruges, Bélgica; Abadia de S. André, 1960.

Nenhum comentário: