sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Teologia Ascética e Mística: A natureza dos escrúpulos

O escrúpulo é uma doença física e moral, que produz uma espécie de loucura na consciência e lhe faz recear, por motivos fúteis, ter ofendido a Deus. Não é enfermidade exclusiva dos principiantes; tanto se encontra neles como nas almas mais adiantadas.


A palavra escrúpulo vem do latim: scrupulus e quer dizer pedrinha. Designou-se durante muito tempo um peso minúsculo, que não fazia inclinar senão as balanças mais sensíveis. Em sentido moral, designa uma razão insignificante, de que somente se preocupam as consciências mais delicadas. Daqui passou a exprimir as inquietações excessiva, que experimentam certas consciências por motivos mais fúteis, de haverem ofendido a Deus. Para melhor lhe conhecermos a natureza, expliquemos a sua providência, os seus graus, a sua distinção entre ele e a consciência delicada.


Providência: O escrúpulo provém umas vezes duma causa puramente natural, outras duma intervenção sobrenatural.


Sob o aspecto natural, é muitas vezes o escrúpulo uma doença física e moral. A doença física que contribui para esta desordem, trata-se de uma espécie de depressão nervosa que torna mais difícil a acertada apreciação das coisas morais, e tende a produzir, sem motivo sério o pensamento opressor de que se cometeu um pecado. Mas há também causas morais, que produzem o mesmo resultado: um espírito meticuloso, que se afoga nas mais ridículas insignificâncias que desejaria ter a certeza absoluta em todas as coisas; um espírito mal esclarecido, que representa a Deus como um juiz não somente severo mas implacável; que, nos atos humanos, confunde a impressão com o consentimento e imagina haver pecado, porque a fantasia foi longa e fortemente impressionada; um espírito obstinado, que prefere seu próprio juízo que ao do confessor, precisamente porque se deixa guiar pelas suas impressões muito mais do que pela razão.



Quando estas duas causas, física e moral, se encontram reunidas, é muito mais profundo o mal, e muito mais difícil de curar.


O escrúpulo pode também provir de uma intervenção preternatural de Deus ou do demônio.

Deus permite essas obsessões, umas vezes para nos castigar, sobretudo da soberba, dos movimentos de vã complacência; outras para nos provar, para nos fazer expiar as faltas passadas, para nos fazer desapegar das consolações espirituais e nos elevar a um grau a mais na santidade; é o que sucede particularmente as almas que Deus quer dispor para a contemplação, como diremos, ao tratar da via unitiva.


O demônio vem por vez enxertar a sua ação sobre uma predisposição mórbida do nosso sistema nervoso, para nos lançar a perturbação da alma: persuade-nos que estamos em pecado mortal, para nos impedir de comungar, ou para nos embaraçar no cumprimento dos nossos deveres de estado; sobretudo porfia enganar-nos sobre a gravidade desta ou daquela ação, para nos fazer pecar formalmente, ainda quando não há matéria de pecado, mormente de pecado grave.


Há evidentemente, muitos graus de escrúpulos: a) ao princípio não é mais que uma consciência meticulosa, excessivamente tímida, que vê pecado onde não há; b) depois, são escrúpulos passageiros que se expõem ao diretor, aceitando, porém, imediatamente a solução que ele dá; c) enfim, o escrúpulo propriamente dito, tenaz, acompanhado de obstinação.

Importa agora distinguir a diferença entre a consciência escrupulosa, da delicada ou timorata.


O ponto de partida não é o mesmo: a consciência delicada ama a Deus com fervor e, para lhe agradar, quer evitar as menores faltas, as menores imperfeições involuntárias; o escrupuloso é guiado por um certo egoísmo, que lhe faz desejar com excessiva ansiedade a segurança de estar em graça.


A consciência delicada, por ter horror ao pecado e por conhecer a própria fraqueza, sente um temor fundado, mas não perturbador, de desagradar a Deus; o escrupuloso alimenta receios fúteis de pecar em todas as circunstâncias.


A consciência timorata sabe manter a distinção entre o pecado mortal e o venial e, em caso de dúvida, submete-se imediatamente ao juízo do seu diretor; o escrupuloso discute asperamente com ele e não se sujeita senão com dificuldade às suas decisões.


Assim como é necessário evitar com todo o cuidado o escrúpulo, assim não há nada mais precioso que a consciência delicada.






(Fonte: Compêndio de Teologia Ascética e Mística - Ed. Apostolado da Imprensa - 1961)

Um comentário:

Eliana disse...

Excelente post, muito explicativo. Obrigada! Precisava de informações para uma pesquisa.