domingo, 3 de fevereiro de 2008

Domingo da Qüinquagésima: "Jesus disse: Vê; a tua fé te salvou."(Ev.)





A Igreja estuda com particular diligência, nas três semanas da septuagésima, as grandes figuras de Adão, Noé e Abraão, que respectivamente apelida: Pai do gênero humano; pai de numerosa descendência; e pai dos crentes. Já estudamos nos domingos da Septuagésima e da Sexagésima os dois primeiros. Vamos estudar hoje Abraão. Na liturgia Ambrosiana o Domingo da Paixão era chamado de o "Domingo de Abraão" e lia-se nos ofícios o responsório de Abraão. Na liturgia romana o evangelho deste domingo é consagrado ainda ao grande Patriarca. Mas depois, quando se juntou a Quaresma o tempo da Septuagésima, reservou-se o Domingo da Qüinquagésima para o Patriarca.





Querendo Deus criar um povo para si e preservá-lo do contágio da idolatria, deu-lhe um chefe que o governasse, a quem chamou Abraão, que quer dizer: pai de muitos povos. Retirou-o de Ur, cidade da Caldeia, e conduziu-lhe para a terra que prometera e guardou-o em todos os seus caminhos. Foi pela fé, diz a Epístola aos Hebreus, que Abraão obedeceu cheio de fé sem saber para onde ia. Foi pela sua fé que chegou a Canaã onde viveu 25 anos como estrangeiro. Foi pela sua fé que já na velhice se tornou pai de Isaac e que não duvidou, à voz de Deus, sacrificá-lo, não a promessa divina de uma posterioridade numerosa. Bem sabia que o Patriarca que Deus era poderoso para ressuscitar seu filho de entre os mortos. E por esse motivo o recuperou, isto em figura. De fato, Isaac, escolhido para ser gloriosa vítima de seu pai, foi uma figura de Jesus Cristo. Assim como ele levou nas costas o instrumento do sacrifício e foi arrancado miraculosamente das garras da morte. Foi assim que Abraão, com a sua fé, acreditando sem hesitar na palavra de Deus, contemplou de longe o triunfo do Senhor na Cruz e alegrou-se. E foi então que Deus lhe confirmou a promessa: "Porque não recusaste sacrificar teu filho único, abençoar-te-ei e dar-te-ei uma descendência tão numerosa quanto as estrelas do céu e como as areias das praias". Esta promessa realizou-as em Jesus Cristo através de sua Paixão e Morte. Jesus Cristo resgatou-nos, diz São Paulo, e deixou-se morrer na Cruz, a fim de que a benção de Abraão fosse comunicada por ele aos gentios e recebêssemos pela fé a promessa do Espírito Santo, quer dizer o espírito de adoção que nos fora prometido. E é por isso que a oração da 5ª leitura do Sábado Santo nos diz que Deus "Pai soberano dos crentes, derrubando abundantemente sobre a Terra a graça da adoção, multiplica os filhos da promessa e pelo mistério pascal constitui Abraão, seu servo, pai de todos os povos. É com efeito pelo batismo (que outrora ministrava na Páscoa e em Pentecostes) que nos tornamos filhos de Abraão e entramos na herança que Deus prometeu a nossos pais e que a Igreja, simboliza pela terra prometida".





A fé em Jesus Cristo, que mereceu a Abraão a prerrogativa de pai dos crentes e nos dá a faculdade de nos tornarmos seus filhos, constitui o tema do evangelho de hoje. Jesus Cristo anuncia a sua Paixão e o triunfo curando um cego dizendo: "A tua fé te salvou". Este cego recobrou a vista, diz São Gregório, na presença dos Apóstolos. E isto foi para confirmar a fé dos que ainda não podiam suportar toda a luz do mistério celeste. Porque era necessário que, vendo-o mais tarde morrer pelo modo que lhes predissera, não duvidassem de que havia de ressuscitar também. A Epístola por seu lado põe por evidência a fé de Abraão. E não é como filhos carnais de Abraão que nos havemos de salvar, mas como filhos de uma fé semelhante a de Abraão. Em Jesus Cristo, diz São Paulo, nem a circuncisão (os judeus), nem ainda a incircuncisão (os gentios) valem nada, mas a fé que opera na caridade. "Andai no amor, continua o Apóstolo, naquele amor de que nos amou Cristo". Neste domingo e nos dois dias seguintes costuma fazer-se uma adoração solene do SS, Sacramento, denominada, adoração das 40 horas, pelos excessos cometidos nestes dias devido a festa do Carnaval. Foi instituída por Santo Afonso Maria Zacarias (+1539) e enriquecida com numerosas indulgências por Clemente XIII.





Evangelho de Domingo:





Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas:



Naquele Tempo: Jesus tomou à parte os Doze e disse-lhes: Eis que subimos a Jerusalém. Tudo o que foi escrito pelos profetas a respeito do Filho do Homem será cumprido.
Ele será entregue aos pagãos. Hão de escarnecer dele, ultrajá-lo, desprezá-lo;
bater-lhe-ão com varas e o farão morrer; e ao terceiro dia ressurgirá.
Mas eles nada disto compreendiam, e estas palavras eram-lhes um enigma cujo sentido não podiam entender.
Ao aproximar-se Jesus de Jericó, estava um cego sentado à beira do caminho, pedindo esmolas.
Ouvindo o ruído da multidão que passava, perguntou o que havia.
Responderam-lhe: É Jesus de Nazaré, que passa.
Ele então exclamou: Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!
Os que vinham na frente repreendiam-no rudemente para que se calasse. Mas ele gritava ainda mais forte: Filho de Davi, tem piedade de mim!
Jesus parou e mandou que lho trouxessem. Chegando ele perto, perguntou-lhe:
Que queres que te faça? Respondeu ele: Senhor, que eu veja.
Jesus lhe disse: Vê! Tua fé te salvou.
E imediatamente ficou vendo e seguia a Jesus, glorificando a Deus. Presenciando isto, todo o povo deu glória a Deus.



Lefebvre, Dom Gaspar. Missal Quotidiano e Vesperal. Bruges, Bélgica; Abadia de S. André, 1960.

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